Olá

Decidi escrever o Blog por achar, como todos que escrevem, que alguém se interessará em ler o que escrevo.

Espero que algo aqui lhe seja últi.

A vida é para ser vivida e o que pudermos aprender para melhorar nossa vivência, melhor.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Solidão ou Individualidade

Quando um marido bate em sua esposa, escolheu o caminho mais fácil. É mais fácil impor suas idéias à força do que no diálogo e na construção do relacionamento. Sua força física – via de regra superior à da esposa – se impõe. Resta à esposa ferida a dor e a humilhação. Algumas buscam a ajuda policial, mas estatisticamente são poucas, e com resultados duvidosos.
A ameaça de violência física não é a única presente nos relacionamentos conjugais. Há ainda a ameaça econômica, onde o marido que provê lembra sempre quem coloca comida na casa. Há a ameaça de tomar os filhos. Há a ameaça de bater nos filhos se a questão não for resolvida do seu jeito. Filhos que apanham de pais que, assim, subjugam suas esposas. Há ainda a ameaça pura e simples do divórcio. A esposa que não sabe onde conseguirá se manter está presa. Ruim com ele, pior (será ?) sem ele. É o casamento que virou prisão. O castelo de fadas que se transformou em tortura medieval.
Encontramos esposas que também regem seus relacionamentos a partir da força. Força sexual, agressividade constante, agressões domésticas. Fatos menos relatados nos relatórios estatísticos, já que para os homens é mais humilhante reportar-se agredido pela esposa.
No campo do relacionamento com os filhos também encontramos facilmente a força como meio impositivo de regras de conduta e afirmação de opiniões. As crianças são o elo mais fraco na vida doméstica. Não somente porque são pequenos em estatura e força, mas pelas dificuldades que possuem em entender e expressar suas emoções. A confusão se instaura na cabeça da criança que sofre mazelas impostas pelos pais. A mãe, ou pai, que lhe é a primeira e maior fonte de amor é também o objeto de seu maior medo e muitas vezes o destino de seu ódio. Ódio que tem que ficar contido pois se colocado para fora pode fazer o amor não ser mais transmitido pela mãe. Sofrem agressões que não rebatem pois precisam ser amadas e não querem correr o risco de perder sua fonte vital de amor. Confusão pura. Dificuldade de relacionamentos. Neurores. São os futuros clientes das, cada vez mais procuradas, clínicas e consultórios psiquiátricos. Ou, na outra ponta, são os futuros clientes do sistema que se aproveita da desorganização emocional que ele carrega e o escraviza e dele se utiliza, sem que ao menos o ser humano saiba que é apenas mais uma peça da engrenagem que faz os outros terem a vida que almejam e ele nunca terá. Em outra ponta ainda, vira o drogado, o viciado, aquele que se entrega a qualquer paixão ou sopro de vida, na boate, na festa, no sexo. Um insaciável por qualquer coisa que o tire da tristeza que vive em sua vida partida entre amar, temer e odiar.
O ser humano foi criado por Deus com a necessidade da comunhão, da comunicação, da troca. Estabelecer relacionamentos é um imperativo para nós tanto quanto manter a vida, alimentar-se ou respirar. Assim como os animais possuem seu instinto que os leva a fazerem sempre as mesmas coisas, como um computador com um só programa rodando indefinidamente, assim também somos dirigidos por certos instintos dos quais fugir não é fácil. Acredito que Deus os colocou em nós para darmos pelo menos a partida no motor. Podemos dirigir o carro, mas algumas coisas tinham que já estar definidas.
Uma delas é, volto a afirmar, a necessidade de comunhão. A troca é uma necessidade básica do ser humano. A solidão um dos maiores castigos. A solitária dos presídios não apenas separa o indivíduo do convívio com outros para que o impeça de continuar a cometer delitos intra grades, mas o castiga ao não relacionamento, a conviver sem a troca. Muitos acabam falando sozinhos o tempo todo. Se prestarmos atenção também veremos aqueles que moram sozinhos pelas ruas da cidade falando o tempo todo. Há um amigo virtual, as vezes o inimigo virtual, mas há alguém. Via de regra o mendigo fala sozinho. A solidão é uma dor tremenda.
Mas viver em comunhão não é fácil. O outro é meu inferno. Quando estou sozinho posso ser eu mesmo (ou pelo menos, posso ser o mais próximo disso que consigo). Quando com outros, sou moldado às relações que se impõe na proximidade do outro. Esta limitação de meu ser nunca será gratuita. Liberdade, diziam quando eu era pequeno, era poder tocar o guarda em suas nádegas (o termo na rua é mais chulo do que isso....). Nada mais adequado numa relação com o outro que é naturalmente restritiva. Tocar as nádegas do outro é proibido, humilhante ao outro e subjulgador (pelas leituras sexuais do ocidente atual) e o guarda per figura justamente aquele cuja função é não deixar isso acontecer com qualquer pessoa, quanto mais com ele mesmo. Imagine a sensação de liberdade: fazer o proibido e justamente com o mais temido.
Mas esta liberdade não existe. O outro sempre será aquele que me limitará nas minhas ações e vontades. O viver em sociedade é prazeroso. Mas tem seu custo. Lembro das vezes que chego em casa cansado e quero apenas um banho e cama. Porém, por vontade própria, sou pai e marido. Meus “outros” mais próximos querem sair. Há uma festa de aniversário de criança. Vou passar quatro horas sentado numa mesa na festa da escola em que não conheço ninguém a não ser minha esposa. Mas o local não é adequado a conversar ou trocar olhares. É cheia de barulho dos brinquedos e crianças correndo e gritando. Salgadinhos gordurosos e palhaços insistindo que eu coloque a peruca rosa. Para mim não é o melhor fim de dia que escolhi. Preciso decidir: eu e meus desejos ou eles e seus desejos. É, eu casei, perdi minha plenitude.
Dá-se então o dilema que muitos enfrentam regularmente: viver livre das restrições impostas pela presença do outro, sofrendo no entanto a solidão, ou ter a oportunidade da troca que alivia e supre meus instintos mais profundos porém com a perda do eu mais pleno.
Penso que a vida em comunhão vale a pena a perda da plenitude do eu. Acho que a maioria esmagadora do planeta concorda – em suas próprias vidas – comigo. O problema, a questão, é o quanto estou disposto a perder de minha liberdade na proximidade do outro. O problema é saber colocar os limites que sejam firmes e claros mas ao mesmo tempo acolhedores e que não afugentem o outro. Alguns são abertos demais aos outro e não se sentem felizes pelo que passaram a ser, outros se fecham tanto em suas próprias vidas tentando manterem-se íntegros em seu ser que, rodeados de pessoas, ainda são solitários.
O marido que bate na esposa ou aquele pai ou mão que espanca o filho escolheu o seu ser antes da abertura que a conversa propicia. É mais fácil assim do que ter que lidar com o relacionamento. Poderia acontecer dele descobrir que estava errado. Poderia ter que descobrir que precisava mudar em alguma coisa. Melhor encerrar o assunto com a agressão: “não quero mudar ou ter que me adaptar à relação”.
A agressão (em qualquer área, não só física) oculta a dificuldade no relacionamento mais humano. Volta-se ao instinto natural. O mais forte – no que for – vence. Ao fraco, resta a resignação.
O forte esquece-se no entanto que a semente que plantamos um dia nasce. Que a sujeira de baixo do tapete um dia aparece. Que água mole em pedra dura tanto bate até que fura. Que com o tempo, o fraco não conseguirá mais perdoar. O fraco não conseguirá mais deixar pra lá. Uma dia a semente da desunião brota em distanciamento, ou raiva, ou apatia, ou inimizade. A relação mingua ou acaba. O castelo que desmorona não o faz somente no lado da esposa ou filho, mas desmorona por completo. O sonho que vira pesadelo assim se transforma para todos os envolvidos. Não há como uma relação ser – de fato – boa para um só. O fraco, ao não se envolver mais com a mesma alegria na relação, a estraga para os dois, querendo ou não.
Já ouvi maridos reclamando da pouca atenção que a esposa lhe dá. Ou da relação sexual na qual ela não participa ativamente. Ou do filho que não lhe ouve ou não lhe conta – espontaneamente – o que aconteceu na escola. Converse com os filhos e a esposa, eu digo, e verá que motivo deve ter. O marido que chama a esposa disso ou daquilo, ofende e agride durante o dia todo não pode esperar que à noite ela seja o poço de amor que deseja, a ardência sexual com que sonha. Quando ele durante o dia plantou a distância esqueceu que a noite ela não acabaria num passe de mágica.
A solução mais fácil nem sempre é a melhor. Frase simples com a qual é fácil concordar. Difícil é lembrar dela quando o que queremos é acabar com a discussão logo e encerrar o assunto.

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