A esposa liga
para o marido durante a tarde em seu trabalho e lhe diz que está faltando ovos
na despensa (que não é dispensa. Dispensa é do verbo dispensar, como ser
dispensado (demitido) do serviço). Ao chegar da tarde, o marido entra em casa e
a esposa, com a massa do bolo parada na cozinha, pergunta sobre os ovos. Ele
responde que não trouxe, aliás, porque ela nem pediu.
Típica
diferença homem-mulher, onde a mulher, ao dizer que falta, queria indicar que
ele deveria fazer compras – mas não foi explícita. Enquanto isso, o marido
típico desligou o telefone e ficou a se perguntar por que a esposa atrapalhou o
seu trabalho lhe informando a quanto ia o estoque doméstico. “Informação
desnecessária”, ele pensa.
Quem já não
passou por isso? Ok, com certeza alguém que está lendo este texto diz “eu, eu
nunca passei por coisas assim”, e considera que o texto já começou mal.
Acontece que a situação acima, e suas variantes, são muito comuns e o texto
fala do típico. Se com você não aconteceu (será mesmo?) melhor. Porém, insistirei no assunto por ser abrangente a muita
gente, tanto casais casados como namorados, noivos, mães e filhos e diversas
outras relações envolvendo sexos diferentes.
A
sensibilidade feminina à necessidade do outro é maior do que a masculina. Sua
predisposição natural ao maior cuidado e carinho com o próximo a leva também a
ser mais atenciosa. Sua leitura das entrelinhas é mais ativa – não
necessariamente mais certeira – e a leva a querer ler com muito mais frequência
aquilo que não foi dito. Enquanto o homem volta-se para seu trabalho sem
entender o telefonema que a esposa deu e logo se reconcentra no que já estava
fazendo, a mulher, na mesma situação, iria se perguntar o porquê daquele contato
e, com mais interesse de obter a resposta do que ele, concluiria que deveria
levar ovos para casa.
Uma
observação: com certeza haverá uma leitora deste texto, de índole mais feminista,
que questionará a afirmação de que a sensibilidade feminina é maior que a
masculina, explicando, mais uma vez, que se trata de algo imposto às mulheres,
que elas não têm as mesmas oportunidades e estímulos que os homens e que se a
sociedade se organizasse de forma mais igualitária isso não aconteceria, pois
tanto homens quanto mulheres têm (ou
teriam) o mesmo cérebro e, nesta vislumbrada sociedade, teriam a mesma
sensibilidade e outras coisas mais em que seríamos iguais. Ora, pois, mas estou
tratando da sociedade atual. Nela, independente do motivo, a sensibilidade
feminina é mais aguçada que a masculina.
Nos círculos
de casais, principalmente, vejo que esta diferença já é, para muitos,
conhecida. Há diversas graças e piadas que retratam o tema. Na principal delas,
o caso da mulher que corta ou pinta o cabelo e o marido nem percebe. Situação
que toda a mulher casada já passou, ou não? Eu já passei por isso e é, para
mim, muito curioso ver que eu não percebi o corte de míseros dois centímetros
no tamanho do cabelo de minha esposa, que não dá para perceber e, no
primeirodia na igreja, TODAS as mulheres elogiam o corte e vêem os tais dois
centímetros a menos. Sinto-me um cego. Ou será que elas tem uma régua virtual
nos olhos? É surpreendente e assustador.
Sendo a
sensibilidade masculina menor, e sendo isto de conhecimento “público”, porque
há uma grande insistência feminina no discurso indireto?O tipo discurso que pressupõe
a ação da diminuída sensibilidade masculina? Porque somos alvos freqüentes de
“faltam ovos
na despensa” ao invés de “poderia trazer 1 dúzia de ovos (de galinha, não de
codorna – é preciso ser claro) quando vier do trabalho ?”
“Amor, hoje não
tenho que fazer minha planilha no trabalho” ao invés de “Amor, vou chegar cedo,
venha mais cedo para ficarmos juntos”
“A imagem da
TV está ruim sempre, né?” ao invés de “querido vamos comprar outra TV porque
esta está ruim”
“A cozinha
está cheirando mal com o lixo acumulado....”
ao invés de “querido, tire o lixo da cozinha por favor ?”, ou ainda
“Tô com uma
vontade de comer lasanha” ao invés de “Querido vamos comer fora hoje naquele
restaurante italiano que eu gosto?”
Ouso pensar em
duas razões:
Primeira: Uma
tendência de todos nós, tanto homens quanto mulheres, de pensar o outro como
sendo assim como sou. Logo, se o outro é como eu, e eu entenderia com poucas
palavras, ele também é assim. Então, não preciso gastar muita conversa para
explicar tudo tão detalhadamente. Mas,
insisto, homens e mulheres são diferentes. E, mulheres leitoras deste texto,
pensar que ele pensa como você é arranjar problemas. Ele é diferente e, diga-se
de passagem, você casou com ele por que ele é homem, né? Você casaria com você
mesma? Portanto, reconhecer as diferenças é vantagem, negá-las, não.
Segunda: Coisa
mais chata num relacionamento é ter que declarar-se precisando de carinho,
beijo, abraço e atenção. Pedir para ser beijado, ou para ganhar presente e
receber, tira um pouco do brilho do que foi dado. Muito melhor é ganhar
demonstrações de afeto de forma espontânea. Assim, quando a esposa diz para o
marido levar o lixo da cozinha pra fora e ele fez, ele atendeu um pedido dela e
ponto final. O porteiro do prédio podia ter feito. Por outro lado, se ela diz
que a cozinha cheira mal e ele tira o lixo, indica que ele pensou no bem estar
dela. O ato, através da indireta, passa a ter um componente de demonstração de
afeto que não acontece quando há um pedido direto.
Mas será que
estou dizendo para as mulheres pararem de usar a indireta? Não. Nunca. Até
porque nós homens também usamos deste artifício, com menos frequência, mas
usamos.
O ponto que
queria traçar neste texto, que acredito ser merecedor de reflexão, é que, sendo
a sensibilidade diferenciada entre homens e mulheres, e sabendo disso, qualquer
relação que envolva pessoas de sexos opostos precisa desenvolver formas de
lidar com a diferença.
Aos homens
digo que devem prestar mais atenção às indiretas da esposa, amiga, namorada. Às
vezes, um presente no final do dia, uma ligação telefônica, um beijo, um elogio
pode ser o que ela espera com tantas tentativas.
Às mulheres,
peço (não digo, pois com mulheres aprendi que se deve pedir, não mandar....
[será ?] Bom, isto é para outro texto.) que percebam que em assuntos de muita
relevância, cujo o não entendimento pode gerar problemas mais sérios do que o
bolo que ficou sem ovos na pia da cozinha, deve-se evitar de exigir dos homens
sensibilidade aguçada. Um pouco de palavras claras e diretas também não faz mal
a ninguém.
Sensibilidade
é uma coisa boa que pode produzir espinhos ou frutos agradáveis. Espero lhes
ajudar a produzir bons frutos.